O blogger é atualizado de acordo com as batidas do meu coração. É um prazer tê-los comigo.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Morri ontem

Morri em Santa Maria ontem. Quem não morreu? Morri aqui, na minha casa, em frente a TV, agarrada a uma almofada. 
Morri com cada um daqueles pais. Foi-se ali, um pouco dos meus filhos também, em uma solidariedade involuntária, simplesmente, por imaginar que aquela dor poderia ter sido minha.
Uma nuvem de fumaça negra arrancou para sempre páginas de centenas de vidas, sufocando o futuro de quem ficou. Todos seguirão avulsos.
Depois de horas de terror, o fogo foi apagado, a fumaça foi se dissipando, mas a morte se instalou com sua implacável eternidade. Vidas corrompidas.
E continuei morrendo ao ver os olhos desesperados de um avô, ao lado do filho que buscava pelo filho...
E continuei morrendo ao lado daquela mãe que esfregava compulsivamente uma mão na outra segurando um terço entre os dedos.
E continuei morrendo porque tenho filhos que tantas vezes demoram a chegar em casa.
E continuei morrendo ao lembrar que  a primeira coisa que faço ao entrar em qualquer ambiente fechado é tentar localizar a saída de emergência.
E continuei morrendo pelas vezes que dizia aos meus filhos que fizessem o mesmo e ficassem sempre o mais próximo possível das portas de saídas. Mas, será que eles, como tantos outros ficam perto do palco, embaixo da banda? Talvez fiquem... Perdi a coragem de perguntá-los sobre isso.
Morri de vergonha porque estava sofrendo por um engano meu, enquanto pais perdiam pedaços seus.
Morri de vergonha porque há poucos dias atrás eu chorei por uma simples viagem desfeita...
Morri de vergonha pelo tanto que acalentei abraçar um corpo recém-amado enquanto pais buscavam reconhecer entre os mortos, corpos que geraram, alimentaram, embalaram, acariciaram, amaram desde sempre e para sempre...
Morri pelos pais que não poderão mais comemorar porque seus filhos passaram no vestibular.
Que não irão dançar com eles, a valsa em suas formaturas.
Que não segurarão netos.
Na dor dilacerante de entranhas desfeitas que assisti nesse domingo, senti vergonha das minhas pequenas dores, e nesse exato momento, elas perderam o sentido, e se desfizeram.
Apesar do sofrimento que une todos aqueles pais de Santa Maria, creio que haverá diferença em cada dor sentida - existirão aqueles pais (divorciados ou não, ricos e pobres, desempregados) que guardam vídeos de momentos protagonizados ao lado dos filhos que morreram - momentos de sorrisos largos, brincadeiras, demonstrações de amor, abraços espontâneos de quem conduziu a vida com pequenos gestos de afeto e outros que terão poucos sorrisos para guardar.
Porque quando a presença vira ausência o que sustenta são as lembranças do que foi e, quando os significados tocam a alma (de quem se foi e de quem ficou), têm o poder de ressignificar o que poderia ter sido, imortalizando sentimentos e sensações para toda a eternidade.  
A vida é apenas um sopro, somos tanto e tão pouco... a dor que bate lá, pode sem aviso, bater aqui. 
Minha solidariedade e compaixão por cada um dos corações  desses pais que foram mortos, e ainda assim, precisarão continuar  vivos...








domingo, 27 de janeiro de 2013

Ressignificando.


Hoje, 29/10/2012, faz exatamente um ano que "uma" das dores que a vida me apresentou, bateu à porta. Lembro-me naqueles dias, em que, arrastada fui a um sítio lindo com meus filhos. Tinha um lago grande e ajoelhei-me à sua beira, mergulhei minha mão na água fria. Quase com medo, olhei e me vi dentro do lago, e, mesmo naquela água tão límpida, meu reflexo estava distorcido. Era a sombra de um futuro que não existiria mais. Havia ainda tanto daquela vida que não seria vivida dentro de mim. Os bougainvilles coloridos em torno, mesmo belos, estavam vergados, como eu. O sol se pondo, lindo, rabiscando o céu azul com nuances de  vermelho e rosa, prenuncio de um entardecer de primavera. Tudo ali era de uma cadência que acariciava a alma, tão diferente da minha vida naquele momento, onde eu buscava desesperadamente encontrar uma simetria. Sentia-me ferida e frágil. E entendi com o tempo que estar ferida e frágil, geram mais ferida e fragilidade.

Sabia que eu era livre para acreditar nas minhas escolhas, e que, o que minhas atitudes mostravam era aquilo em que eu acreditava. Faltava redescobrir no que eu acreditava naquele momento, para fazer as mudanças e recomeçar. Foi o que fiz. Em um dia de chuva forte, desci as escadas da minha casa e parei sob ela. Enquanto os pingos grossos e gelados pareciam furar minha pele e congelar meu sangue, eu pedia a Deus que, por favor, lavasse a dor.  Com o tempo, aquela sensação de imperfeição e inutilidade foi dando lugar a mim mesma e percebi que eu começava meu caminho de volta e relembrei aquilo que sempre defendi - todas as decisões nascem daquilo que acreditamos ser, e mostram o valor que damos a nós mesmos.
Eu sabia que em algum lugar dentro de mim estava a verdadeira paz, e que eu não dependia de nada para encontrá-la. Admiti meus erros, me perdoei, libertei a dor e me agarrei à crença que tenho de que não há erro que não possa ser corrigido e nem transgressão que não possa ser perdoada, e, nesse momento, voltei a escutar sons, sentir cheiros, ver cores. Voltei à vida. Ao abandonar a posição de vítima signifiquei aquela dor, ressignifiquei minha vida e segui com a coragem de sempre.
Li certa vez que, em todas as dificuldades, aflição e perplexidade, Cristo chama-nos e suavemente diz: "Meu irmão, escolhe outra vez." 

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Eu poderia tentar, talvez até tente...

Quase me acostumei a olhar para certas pessoas de uma forma da qual elas não eram. Olhos verdes esmeraldas, eram violetas, fartos cabelos encaracolados, eram ralos, sorriso largo que nunca sorria, descontração na voz sempre muda. Nada era como eu via. Mas eu juro que via. Nada era igual. Seu olhar não me explica o que realmente é, e o que só parece ser. Fomos incapazes de existir. Não sangrei mais. Ninguém acorda. Tenho perdido as paisagens e ando nos atalhos que alongam os caminhos. Não me deixam sozinha e sinto que aos poucos me refaço e aos muitos, me desfaço. Ouço música sem ouvi-la e ainda assim, somo no seu compasso. Para amar há de se observar. Quando apenas se é amado, melhor não. Ao amar, nada subtrai, os maiores defeitos viram pó. Ser amado (ainda) sem amar (porque dizem que o amor pode nascer), é olho na espreita, por detrás do vão da porta, esperando um fio de cabelo fora do lugar para, aliviada, declarar a si mesmo "viu porque não o amo?" Mas em frente ao espelho, não há engano possível...  
E a campainha toca pontualmente às oito, e a flor entra, linda, enfeitando meu dia, amo flores, mas como faço para conseguir amar o que está por trás das flores? E o telefone toca dezenas de vezes, a voz firme tenta me coroar rainha, enquanto sequer voltei meu olhar em direção ao castelo... O corpo carente se contrai diante do olhar engessado de desejo, contrai mas se retrai, e volto para casa. Sorrio frente a tantas declarações feitas desavergonhadamente na presença de tantas pessoas e penso com raiva jogando para quem me ama a responsabilidade por não amá-lo: "Porque você não consegue me convencer? Incompetente! Preciso disso, não vê? Que merda!" Por fim, tudo aquilo  enternece. Mas, só enternece. De alguns escuto que amor é treino, é fazer uma escolha e permitir ser amada, e aguardar pacientemente que esse mesmo amor nasça em você, podendo finalmente amar e ser amada. Porque não acredito nisso? Eu poderia tentar, talvez até tente... Acho tudo tão irritantemente racional... E eu, sempre tão intensa e passional.  Eternamente dividida entre o que é e o que deveria ser...
Como diz Pessoa - "Este perpétuo analisar de tudo é que tira a inocência verdadeira"
Nunca quis amar o belo, o perfeito, o incólume, aliás nem nunca quis amar. E, de repente amei. Mas posso (des) amar e (re) amar, porque viver é (re) criar.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Minha latinha de refrigerante

Quando criança eu adorava brincar de significado/significância - olhava para uma latinha de refrigerante  e imaginava o que mais ela poderia ser além de uma latinha de refrigerante - um carrinho, um foguete, um cachorro. E nada me escapava,  era divertido reinventar as coisas. De alguma forma segui fazendo isso. 
A destreza com que recoloco, transfiro, remanejo acontecimentos e pessoas  em minha vida ainda me surpreende. A segurança com que convido alguém a ocupar o topo da minha alma é a mesma usada quando estendo-lhe a mão e convido-a a descer e se retirar. Eu me concedo sentimentos de segurança. Ainda sou um pouco dona do meu universo. Além do que, me é inerente o sentir-me extremamente livre. Desconheço dependências, e,  nas poucas vezes que digo "preciso de você" assusto-me e recuo. Sei que não preciso, apenas quero. Eu sempre vou seguir, independente das pessoas. 
Quando o dia nasce, nasce com ele outro de mim, em um processo diário de reconhecimento "do ser e do vir a ser". Para mim, o segredo para se viver bem é adaptar-se. Minha capacidade de adaptação é imensa. Quando eu era casada, temia dirigir na estrada, detestava fazer compras de mercado sozinha, tinha preguiça de levar o carro para revisão e não concebia a ideia de dormir sozinha. Com poucos dias de solteira fazia tudo isso com a mesma naturalidade com que abro meus os olhos pela manhã. As ideias e as pessoas só me fazem falta enquanto concedo-lhe esse direito, mas no momento em que eu decido, tudo que era deixa de ser, e confesso, que até eu me assusto com a solidez que isso se dá. 
Eu tenho sonhos, claro, mas muitas vezes desfaço-o ainda no ar, imagino que é tão frustrante quanto abortar o lançamento de um foguete, mas da mesma forma, necessário. Meço muito bem se o ganho possível é maior que o prejuízo provável. 
Eu ressignifico o mundo que me cerca ou me reinvento para esse mundo, calmamente, enquanto tomo um sorvete. A frase do  crítico francês Andre Gide -"As coisas apenas valem pela importância que lhes damos"  norteia minha vida e relações. É simples viver. Difícil é quando se faz resistência à vida. A maioria vive do que virá - serei feliz quando alguém chegar ou alguma coisa mudar. Fatores externos nunca deveriam ser determinante ao bem estar de alguém. Isso é óbvio. Basta ver exemplos  mostrados na TV - a mãe que perdeu seus 4 filhos em uma tragédia natural, abriu uma creche para cuidar das crianças que ficaram órfãs, e conta isso com sorriso no rosto, enquanto a outra perdeu o marido na mesma tragédia e tentou o suicídio.
Dependência gera controle. Controle é sempre ilusório. A conquista, seja ela de que natureza for, só se dá verdadeiramente, quando se oferece a liberdade. A mão que liberta é a mesma que recebe. 
Sempre vou transformar minha latinha de refrigerante em um móbile bem bonito, porque minha vida quem cria sou eu. Esse poder é somente meu.

"Não: Não quero nada. Já disse que não quero nada. Não me venham com conclusões! A única conclusão é morrer" (Fernando Pessoa via Álvaro Campos.)

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Outra flor, outra dança, outra música, outro amor


Dizem que felicidade não existe, que existem momentos felizes. Conclui-se então, que tristeza também não existe, que existem momentos tristes. Portanto, confirmando, vida é alternância, onde estamos todos sentados em nossas gangorras, submetidos ao eterno ir e vir dos acontecimentos. À mercê? Sim... à mercê.
Compreender e aceitar isso não trás felicidade, mas evita brigas com o vento impendido-nos sentir a brisa.
Na contra mão do determinismo, nos foi concedido total e absoluto direito ao nosso sentir. Não há destino para os sentimentos. Ao senhor e todo poderoso destino cabe nos presentear com dias de sol ou chuva, e a nós, decidir se vamos sorrir ou chorar sob a água fria e os raios quentes. Sentimentos são negociáveis, e isso é confortante. Não sabemos o que vem de encontro a nós, mas podemos decidir como receber cada acontecimento - se com uma vassoura atrás da porta ou com os braços abertos. 
Exceto o que está determinado, o resto é escolha. Tão óbvio... Faz-se necessário um exílio interno para que determinemos o que não está determinado.
A ilusão, é um forte aliado ao estado de felicidade. Talvez seja um braço frágil, ainda não sei, mas percebo-a bem útil. Excesso de realidade faz com que a vida torne-se um constante fardo. Sonhar permite seguir de mãos dadas com desenrolar dos dias. 
É certo que em um momento qualquer, a ilusão se desfaz (exigindo substituição) e desaba a maldita realidade sobre você, deixando-o atordoado em meio a névoa ainda carregada do cheiro doce daquilo que poderia ter sido, e aí, você se entrega ao desalento, e dorme de roupa e maldiz a sua sorte e se desfaz em lágrimas, quando, de repente o sol nasce, indiferente ao seu dia, até então, inegociavelmente cinza. Hora de escolher. 
Eu sempre opto por outro sonho - outra flor, outra dança, outra música, outro amor. Porque no fundo, no fundo, a vida é simples assim.
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