O blogger é atualizado de acordo com as batidas do meu coração. É um prazer tê-los comigo.

domingo, 30 de junho de 2013

Paixão

 
A paixão nos priva dos sentidos. Qualquer tentativa de alerta é poeira ao vento. Paixão é fatal.
Não pensar é o lema dos apaixonados. Jogam ao lixo coisinhas básicas como refletir, analisar, ponderar. Aconteça o que acontecer você terá sempre uma desculpa para justificar aquele ser imaculado, objeto de sua paixão. Ele pode mentir, trair, ouvir funk, esquecer o dia do seu aniversário, pois nada (por enquanto) fará com que você veja, o que todos já estão vendo. Não há realidade possível que não aquela projetada pela paixão. Indivíduos lúcidos passam a ser marionete desse sentimento. É um imobilizador poderoso essa tal de paixão! A sorte é que um dia passa.  Se tudo correu bem no período em que você estava anestesiado, e você mereceu o respeito e a consideração do outro, pode ser que aquela paixão se transforme em um duradouro amor. Mas, se você se certificar que foi tudo uma farsa, aí... "Onde estavam os meus amigos que nem me avisaram?" Avisaram sim... Você é que se encontrava temporariamente fora do ar. Agora que voltou a ser um ser pensante, não adianta se culpar. Mais dia, menos dia, TODOS os mortais são acometidos por esse mal-estar súbito e, com sorte, breve. Paixão é irracionalidade pura, é desgoverno de si, do outro e do mundo, é navegar em mar aberto sobre barco de papel. Conselho? É reles. Evidências? Minimizadas. Aviso de diversos "ex"? Dá uma coceirinha que passa como um passe de mágica, assim que aquela voz quente e apaixonada desmente tudo. Não há o que se fazer. Para quem está de fora, resta aguardar e torcer para que não haja um grande estrago. Mas quase sempre há. Ficamos todos sorumbáticos.
Também já naveguei por essas águas e posso garantir - o barco de papel  afunda mais rápido do que se imagina. A boa notícia é que você se afoga mas não morre... Adoece, emagrece, entristece, tira o sono, a força, a coragem. Mas basta nadar e você alcançará a margem. Nunca ouvi dizer que alguém morreu de paixão. Uma hora passa! Isso é certeiro! E a alma que parecia apartada de tudo retornará dando vida ao corpo e então, você irá compreender o que aconteceu e esperar que um amor de verdade chegue.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

E voltei a ficar de frente para o mar...

E  a cada vez que eu caía, levantava depressa batia as mãos nos joelhos, limpava a poeira e seguia em frente. Poucas vezes olhei para trás, e creio que isso se deu por covardia e não por coragem.  Quantas vezes escolhi sem convicção... Noutras foi um acreditar tão grande que abarcou qualquer outra opção. O destino achou de me dar seguidas rasteiras. O meu, claro. Afinal de que me importa o dos outros? Nada, desde que ficassem bem longe do meu. Mas destinos se tocam para que sejam cumpridos. Dane-se. Desconheço revolta, mas me sobra indignação. E me perturba dia e noite. Ainda. Odeio ser fantoche. Não nasci pronta para quase nada. Vou tateando tudo. Mas é vital que eu me sinta dona de mim. Detesto jogos e apostas. Achei que vivesse longe disso. Talvez tenha vivido. Até que me vi dentro de um cassino, ingenuamente acreditando estar em frente ao mar. Merda. Ao invés de sair pela porta dos fundos, fiquei. Abri mão de avistar o horizonte. Só vi roletas que giravam a minha frente. Detesto roletas, detesto o barulho, a confusão de luzes artificiais, o cheiro de perfumes fortes, misturados ao vazio. Fiquei tonta. Dopada. Quase me esqueci do mar. Me perdi entre pessoas. Fiquei estranha. Uma ilustre desconhecida. Pensei mal de mim. Semanas depois e dezenas de quilos a menos no corpo e na alma, chego a conclusão de que não fui feita para jogatinas... Fui feita para olhar o mar.  Já levantei mas ainda limpo a poeira dos joelhos. Dessa vez olhei para trás inúmeras vezes. Queria avistar pela última vez aquele que me jogou ao chão. Mas nunca tinha ninguém. Para onde foi? Tão mais fácil fingir. Não sei fugir. Deveria? Não vi o momento em que aquela mão tão conhecida me empurrou... Mais uma vez devia estar distraída em minha cadeira lendo Fernando Pessoa. Eu posso ficar distraída. Posso dar as costas. Não tenho grandes fantasmas a temer. Ou, pelo menos, não tinha. 
Não sinto falta.  Não há perda onde nunca houve ganho. Nem mentira onde nunca houve verdade. Aliás, não há nada. Nem ao menos lição. Só eu. Podia ter ficado tanta coisa daquilo que não ficou. Lamento tanto... É um nada. Nem ninguém. Nem explicação. Nem lembrança. Ainda que a tentativa desesperada de acreditar que alguma coisa foi de verdade. Só para guardar comigo, senão a pessoa, pelo menos a história.
Alguma coisa nessa história toda (ainda não descobri o quê), merece meu respeito. Mas nem mesmo para isso, encontro explicação.
Pelo menos voltei a ficar de frente para o mar quando vou ao Rio de Janeiro. E isso, não tem preço.
 

quarta-feira, 26 de junho de 2013

"O amor que eu sempre quis, me diz pra gente ser feliz..."

Jussara me permitiu falar aqui sobre sua história que tem muito a dizer. Logo após seu difícil divórcio (redundante!), começou um namoro com Jonas que durou 7 anos. Davam-se assustadoramente bem (como ela definiu). Ele sempre deixou claro que jamais se casaria. A mãe, doente, era responsabilidade dela, a cada último domingo do mês (tarefa dividida entre os quatro irmãos). Todos os fins de semana eram passados na fazenda de Jonas, há 30 km da cidade, programa que Jussara fazia com imenso prazer. Só se separavam  quando era o plantão dela com a mãe. Um dia, sem que ela percebesse nenhum sinal que indicasse a intenção, ele terminou a relação. Ela quase morreu - de susto e de sofrimento. Implorou por explicações. Onde estavam as juras de amor? Mas ele simplesmente não queria mais. Dentro de 6 meses, ele iniciou o namoro com uma garota, e em 10 meses estavam vivendo juntos. Novamente, ela quase morreu. Dessa vez de indignação (indignação, de fato, é letal). Buscava em vão, compreender. Ela o procurava e ele, creio que pelo respeito e consideração por outro ser humano, em detrimento do amor que não existia mais, a recebia,  tentava uma nova explicação preocupado com o sofrimento dela (como ela narrou) mas só repetia o de sempre - "não tenho a explicação, você é excelente pessoa, mas não quero mais, sinto muito". O tempo passou e ela ainda não se conformou. Quer entender porque o amor acabou repentinamente. Ela me pediu, e conversamos pelo msn. "Você não se negava a ver um mínimo sinal que fosse? Acha que era mesmo tão perfeito assim?" Perguntei. E ela disse que estranhava somente o fato de, nesses 7 anos, ele nunca ter aberto mão de um final de semana na fazenda para ficar ao lado dela em seus plantões com a mãe. SOMENTE? O cara que te ama não se propôs a abrir mão de 1 domingo entre os 330 que houveram, para ficar ao seu lado nas mínimas vezes em que você não podia estar ao lado dele... "Isso te incomodava tanto que você está narrando, mas ainda insiste em minimizar o fato com um "somente".  E ela emendou "Acho que ele não me amava... eu apenas era uma boa companhia, gostávamos das mesmas coisas..." E isso não poderia ser amor? Afinal, o que é amar? Eu não sei. Alguém sabe? Não creio. Não há modelo que possa definir - "isso aqui é amor". A medida que vou vivendo vou compreendendo que não importa em nada essa definição. Isso é romantismo, apenas. A realidade impera de outra forma. Palavras o vento leva. Vamos aos fatos. Importa saber se o amor que o outro te oferece, te faz feliz. Pronto. Simples assim. Agora, se é mesmo amor, se é imenso, se é estranho, nada disso importa... Para que catalogar? 
Ela me perguntou "você acha que estava aí o indício de que ele não me amava?" Não. Acho que estava aí o indício de que esse amor não te faria feliz. Só isso.
A mim, por exemplo, não interessa um amor que não seja solidário - em 330 domingos nem um ao meu lado? Eu não seria feliz assim. Mas muitas outras podem ser. Não dá para rotular. Eu supero uma traição, mas não supero uma covardia ou egoísmo. Outras superam covardias e não superam a traição. Que importa quem supera o que? Nada disso define se é ou não amor. O erro está na pergunta que as pessoas se fazem... Ao invés de buscar saber se sou amada, é fundamental buscar saber se sou feliz com esse amor. As milhares de pessoas que matam o companheiro em nome do amor, a meu ver, de fato, os amavam. E ainda assim, os mataram. Mataram por amor. Clichê, mas real.
Enfim, se o tipo de amor que alguém te oferece é um amor companheiro, que te faz um ser humano melhor, que te ensina, que te acrescenta algo, que te deslumbra, que te faz admirar e ser admirada, mas, por alguma razão deixa faltar algo e, por isso, não te faz feliz, não insista... A pergunta é: Importa a mim ser amada, ou ser feliz? Porque as duas coisas muitas vezes NÃO andam juntas.
"Quando você aprende a ser feliz, não consegue mais tolerar aquelas pessoas que fazem você se sentir diminuído".
E como canta o grande Emílio Santiago:
"E o que é o amor, pergunta sem resposta
Quem sabe o coração quem sabe
Mesmo sem falar, eu ouço o que você não diz
O amor que eu sempre quis,
Me diz pra gente ser feliz"

terça-feira, 25 de junho de 2013

Tudo é relativo

Reconhecimento é a palavra que mais se aproxima do que acredito que possamos ter acerca daquilo que existe fora de nós, pois só podemos conhecer o que já está em nós. Portanto apenas reconhecemos o que nos cerca, ou seja, conhecemos sob um olhar próprio. Uma ótica interna que pouca chance nos dá de enxergar de outro modo, que não aquele que nos experimentamos através de nossa vivência e apreendemos a partir dos sentidos. 
Capacidade de abstração é algo que acho necessário para a criação e evolução de novas ideias. Esse nosso "intelecto agente" consegue abstrair idéias ainda distante dos objetos em si, e nos permite imaginar resultados diversos antes da ação. Mas até mesmo essa capacidade de abstrair é, de certa forma, engessada pela nossa bagagem interna. 
Aí chegamos a relatividade dos conceitos - certo e errado, bom e mal, verdade e mentira.
Conceitos são sempre fragmentados, não há uma unidade, uma coerência lógica entre eles. Ele é preenchido sempre pela concepção ideológica de cada um. Um marxista descreve o fundamentalismo de uma forma, se esse conceito for definido por um liberal, o posicionamento é outro. Há um indiscutível vácuo no campo das referências teóricas por conta da fragilidade a não sustentação de alguns conceitos. 
O que é real quando o conceito de real é relativo? Real é uma crença individual? Cada um cultiva sua realidade? Se o real nasce do nosso imaginário, nossa existência faz parte desse imaginário? Por outro lado se minha realidade particular se sobrepuser às normas e regras sociais como será o mundo em sociedade? 
Todos os conceitos existem e se manifestam - o bem, o mal, o amor, a honestidade, a traição, a lealdade, a tristeza, a felicidade - a compreensão de que tudo é relativo porque só existe a partir da concepção individual de cada ser humano, faz a vida ficar mais fácil e o coração mais leve.

http://www.marcelolopes.jor.br/blog/artigo/141/tudo-e-relativo

domingo, 23 de junho de 2013

Deus sinaliza para mim

Estava ainda na imponente recepção daquele hospital gigante, aguardando um quarto para que minha mãe fosse internada, quando um enfermeiro a levou dali, direto para o centro cirúrgico. Fiquei entre zonza e impotente vendo-o conduzi-la sem muita explicação para a cirurgia. Ela foi chorando me perguntando porque não fomos, antes, para o quarto, enquanto eu fiquei sorrindo em meio a malas e travesseiros jurando a ela que tudo correria bem. Como correu, graças a Deus.
E eu voltei a assentar, sem mais me preocupar com o quarto. Eu precisava chorar. Coloquei os óculos escuros, recostei-me na confortável cadeira daquela recepção lotada de pessoas elegantemente vestidas (como as pessoas se produzem tanto para ir a um hospital? Vai ver eu é que beiro mesmo ao desleixo, com meus eternos tênis e jeans). Minha mãe se foi e eu não rezei dessa vez. Só chorei. Senti uma compaixão inexplicável pelo mundo, pelas pessoas, por mim mesma. É uma vida de tantas perdas... essa, de todos nós. Muitas vezes desejei sentir menos. Ou, quem sabe nada. Eu queria chorar ali só pela minha mãe. Mas chorei pela moça que estava ao meu lado e que acabara de saber que não poderia ser mãe. Chorei pelo porteiro do hospital que me contou que o filho drogado lhe deu um tiro em um momento de fúria. Chorei pelo bebê lindo que recebia alta, depois de três dias de UTI. Tão pequenino. 
 Meu último ano não foi nada fácil, como o de tantas milhares de pessoas. Nunca me acho vítima, só fico exausta buscando as lições. Errar os mesmos erros é um poderoso aniquilador da auto confiança. E tento não me punir, mas juro que vou ser mais dura para encarar a vida e as pessoas dali em diante. Em vão. A primeira coisa que digo aos meus alunos é que se emocionem. Sempre. Eu não saberia fazer diferente. A dor do outro é a minha. Sempre será. Por mais que isso me imbecilize aos olhos de muitos. A cada dia tenho mais convicção de que isso aqui é ínfimo perto do tanto que me espera nessa imensa existência que todos protagonizamos. Então, de que me importa os olhos dos outros? 
Fui para rua, caminhar, sem me importar com o que seria feito das malas e travesseiros. Um senhora estava sentada pedindo esmola. Eu estava com uma estranha sensação que por vezes me acompanha, de que tudo é uma grande ilusão. Eu, o mundo, e aquela indigente. Poderia ser ela a angustiada por causa da mãe no centro cirúrgico e eu ali, a pedinte, em seu lugar. Ou seria mesmo assim? Nesses momentos, perco os poucos limites que me centram... Afinal quem sou eu? Acho que fiquei parada olhando por tempo demais, o que a levou a me perguntar porque eu tinha chorado. Eu acho que falei algumas coisas desconexas que nem me lembro. Ela, então, me deu uma medalhinha de São Jorge e tinha lágrimas nos olhos. Lembrei de Rubem Alves que diz "Não vemos o que vemos, nós vemos o que somos. Só veem as belezas do mundo aqueles que têm belezas dentro de si". Ela tinha a beleza. No meio da miséria. Como uma flor no pântano. Ela se preocupou com um semelhante, ela se emocionou. E é assim, desse jeito, que Deus sinaliza para mim nas poucas vezes em que acho que vou perder as forças.
 

quinta-feira, 20 de junho de 2013

Modéstia à parte...


Três cegos foram a um mestre discutir o que era Deus. Eles não conseguiam entrar em um acordo. O mestre, então, coloca-os próximo a um objeto e pede que cada um o descreva e diga o que é. O primeiro disse que era uma cobra; o segundo, uma árvore; e o terceiro, um grande vaso de argila. O mestre, então, lhes conta que o objeto era, na verdade, um elefante. Cada um sentia uma parte, por isso não tinham dimensão do que era o todo, mas todos falavam do mesmo ser.
E ao me deparar com esse escrito entendi que basta! Chega desse desgaste de tentar encontrar soluções para coisas que, por mais que me atinjam, estão acontecendo completamente à parte de mim. Venho atribuindo um significado aos acontecimentos que me cercam e quero que os outros enxerguem através dos meus olhos, mas isso é impossível! O problema é um, os envolvidos são vários, e cada um vê como lhe convém. Portanto chega de lutar... Exatamente isso, uma luta exaustiva, totalmente em vão. Eu não preciso provar nada nem para as pessoas próximas, que dirá para aquelas absolutamente distantes da minha alma, do meu coração e do meu corpo. 
Trocando ideia com uma grande amiga sobre esse assunto que tem me consumido, até mesmo, fisicamente,  mostrei-lhe um texto exaltado que fazia referência a esse cenário surreal, para que ela pudesse entender melhor e, passei-lhe a minha impressão - a de que aquele desabafo mostrava que outras pessoas, além de mim, estavam sendo roubadas em sua paz. Ela leu, releu, olhou para mim incrédula e disse "Não acredito! Não entendeu que esse texto foi escrito para atingir diretamente a você?" Ainda resisti - "claro que não foi para mim"... Porque seria? E ela leu frase por frase, interpretou, argumentou e me fez, finalmente aceitar que sim, aquele monte de palavras que demonstravam uma ira descontrolada, uma deselegância tão distante da minha realidade, um preconceito típico de almas escuras, inflamadas, adoecidas, estava direcionado a mim. Eu ri. Mais uma vez lá estava eu fazendo parte desse cenário de quinta categoria, sem ao menos desconfiar disso. Mas nenhum sentimento além de compaixão, teve o poder de me atingir.
Por vezes eu fico irritada comigo mesma - como posso ser tão boba? Mas resolvi me fazer um carinho perante tudo isso... Sou consciente de que não sou uma tola ingênua. Mas como disse essa amiga, dessa vez escorreguei na minha boa intenção e caí de cara na lama. Fato. É bem verdade, que, muitas vezes, eu peco por olhar o outro de forma crédula. Mas olho da única maneira que posso olhar, ou seja, através das minhas referências internas e aí muitas vezes, compro "gato por lebre". Mas não seria isso motivo de orgulho para mim? Sim. Claro que sim.
Eu sou imensamente importante para muita gente, eu sou tão querida, mas tão querida, que fica difícil a quem é apenas mais um no mundo, entender isso. Eu não sou corpo, sou alma. Eu sou leve. Eu sou plural. Eu sou doce. Sou simples. Talvez eu seja mesmo muito feia, envelhecida, fora do peso, pode ser... Mas minha alma é bonita. E, acredite se quiser, é bonita desde que eu era muito linda, muito nova, e de curvas perfeitas. Apesar de que, isso nunca me importou. Odeio estética, a não ser aquela de Aristóteles que estava ligada a ética. Coisas de filósofa.
Sou boa. Sinto a vida. Tenho bons olhos. Boa alma. Bom coração. Eu não me escoro em templos. Nem em escrituras. Não sigo a lei de Deus. Eu apenas me guio pelo meu coração, e nele, está Deus. Eu sou eu. Não carrego culpa. Não faço nada por obediência. E nem mesmo porque me convém. Sou livre como poucas pessoas e por isso, talvez por isso, eu seja tão amada e admirada. Incrível isso, mas eu sou uma pessoa admirada! Nunca disse isso, nem para mim mesma, e agora estou aqui, dizendo. Eu sei perder. Eu sei ganhar. Não julgo. Aceito. Respeito. Enxergo as pessoas além do que elas me dão. Me frustro, mas mantenho a dignidade de não mudar meus conceitos em relação a coisas e pessoas por causa desse fato. Sou humilde. E extremamente desapegada.
Eu sei somar e dividir. Eu tenho uma pureza que não se contamina. Difícil né? Pois é... Mas é assim.
Resisti ao que a maioria não resistiu: não fui contaminada. Quer saber? Modéstia à parte, sou mesmo rara e isso, de fato, incomoda. Sinto muito.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Apeles e a busca por justiça

Se ainda não me sinto sob controle para , mediante uma situação surreal, escrever de forma mais racional, já que sou um poço fundo de emoção (o que, me protege de uma vida sob controle, o que para mim, significaria uma vida amorfa, insossa e inodora) vou ainda me abster de me expor escrevendo, mas, de outro modo, vou voltar a "falar" porque em um momento onde o Brasil fala, eu me lembrei que, se nunca antes me calei, porque o faria agora?
Mitos foram criados para explicar uma série de coisas que fugiam a compreensão humana... Portanto, nada melhor que eles nesse momento.

Ao ser injustamente difamado por seu rival Antífilos, que o acusou de ser cúmplice de uma conspiração diante do crédulo rei do Egito, Apeles provou sua inocência e para expressar sua indignação ele pintou um quadro. A pintura mostra um homem inocente arrastado diante do trono pelas personificações da Calúnia, da Malícia, da Fraude ou Dolos e da Inveja. Eles são seguidos de um lado pelo Remorso, uma anciã angustiada que veste roupas surradas, que vira-se para enfrentar a Verdade nua, bela e pudica, que aponta para o céu. 
A nudez da Verdade a relaciona ao jovem inocente, cujas mãos postas significam o apelo a um poder superior. Assim como o jovem inocente quase tão nu quanto ela, a Verdade não tem nada a esconder. Com seus gestos eloquentes e a expressão da única figura proeminente na pintura, ao apontar para o alto em direção ao céu mostra que uma Justiça mais elevada será dispensada ao acusado.
O Rancor, vestido de preto, conduz a Calúnia com a mão direita. A Calúnia empunha uma tocha acesa com a mão esquerda, símbolo das mentiras que ela espalhou, enquanto arrasta pelos cabelos sua vítima, o jovem seminu, pela mão direita. A Inocência do rapaz é representada pela sua nudez, que significa que ele nada tem a esconder. Ele cruza as mãos em vão, como que rogando a sua libertação a um poder superior.
Por detrás da Calúnia, as figuras da Fraude ou Dolos e da Inveja estão cuidadosamente ocupadas em trançar, hipocritamente, os cabelos de sua amante, a Calúnia, com uma fita branca e espalha rosas sobre sua cabeça e ombros. Ao serem representadas com as formas enganosas de belas moças, elas estão fazendo um uso insidioso dos símbolos da pureza e da inocência para adornar as mentiras da Calúnia.
O rei está sentado num trono erguido em um salão aberto, decorado com relevos e esculturas. Ele está ladeado pelas personificações alegóricas da Ignorância e da Suspeita, que estão avidamente sussurrando rumores em suas orelhas de burro, que simbolizam a imprudência e a natureza tola do rei. Ele tem os olhos apertados, mostrando que é incapaz de ver o que está realmente acontecendo e estende a mão cansada para o Rancor em pé diante dele.

domingo, 9 de junho de 2013

Aos meus leitores

Chegou a hora de me recolher, para me nortear e me curar. Largar esse caminho sombrio que quase me convenceu que sou pior do que realmente sou. Quando percebi que eu estava duvidando de mim mesma, entendi que o cenário enlouquecedor, onde me encontrava, estava me confundindo e me levando a quase me perder. Por vezes me olhei como alguns desses olhos alheios que nunca conseguiram perceber quem sou eu, e  acabei quase acreditando neles, e vendo em mim, uma pequenez que nunca foi minha. Fui imprudente, embrenhei pelo desconhecido e, quando me dei conta, estava dentro de um labirinto. Enganei-me no volume,  massa,  temperatura,  densidade e a pressão, enfim, todas as minhas "unidades de medidas" falharam... Jamais havia errado com tamanha intensidade. Meus olhos enxergaram o que não existia. Como pude sentir tão profundamente onde tudo era raso? Falhei em gênero, número e grau. Todos os meus sentidos me enganaram. Até mesmo a minha racionalidade.  Preciso agir para evitar que me esmaguem ainda mais. E, principalmente para continuar a caminhada que me levará à saída definitiva dessa estrada. Em uma ou outra situação da minha vida pulei do 13ª andar  sem rede de proteção. Me arrebentei. Mas me perdoei rápido, pois era um período onde ainda tateava a vida. Mas dessa vez está difícil entender como pude pular do 40º andar de costas e, sem nenhuma proteção, e por mais de uma vez. Todos me consideram tão madura, sensata, coerente, equilibrada... Inexplicável minha atitude tão irresponsável. Até outro dia eu ainda me defendia de minha auto punição. Hoje não posso mais. Não tenho absolutamente ninguém a quem culpar, a não ser eu mesma. Me absolvi, pois preciso de mim para achar essa saída... Para tanto, penso em quem sou eu, em quantas pessoas me respeitam, me amam, me têm consideração e me são leais. Tenho precisado de reforço. Ficar perto de quem me admira para que eu possa retornar mais rápido. Bom, como forma de me ajudar a finalizar esse processo, preciso deixar de fazer o que mais amo nessa vida - escrever no meu blog. Um blog que criei a três anos, independente de qualquer tipo de envolvimento paralelo. Meu blog é fato, é sério, é só meu. Agora, estou privada de escrever nele. A vida é assim. A gente erra e paga. É a lei. Jamais o encerraria, o manterei aberto, continuarei recebendo e respondendo os desabafos dos leitores, mas não vou escrever mais. Ainda não sei por quanto tempo. Mas preciso que seja assim. O que sempre significou a minha cura, tornou-se meu tormento. Minhas palavras servem hoje como peças de um quebra cabeças, onde muitas vezes sou eu a magoada, e noutras magoo. E como nada mais faz sentido para mim, nesse imenso jogo de encaixe, não tenho a mínima intenção de dar elementos que façam crescer o tormento alheio. Não costumo dar a outra face, mas também nunca dou o troco. Não é porque estou me sentindo magoada e desrespeitada que farei o mesmo. Jamais. Me agarro dia e noite para não ceder à tentação de acreditar que sou melhor que muita gente. Certamente não sou. Sou só mais uma em meio à multidão. Mas gosto de quem sou, gosto daquilo que me esforço para me tornar dia a dia. Minha existência só faz sentido porque busco a única coisa que, de fato, existe para mim nessa vida - a minha evolução. E qualquer coisa que me atrase, não é bem vinda. Enquanto eu acreditava de corpo, alma e coração que eu avançava, na verdade, eu me atrasava, e, certamente, atrasava os outros, e vi isso no momento em que percebi que meus olhos sempre tão ternos, estavam olhando para o mundo quase todo com desconfiança, ainda que, jurando com a alma, sobre a confiabilidade de alguns. Mas isso é passado.
E, como tudo passa, breve  isso será apenas parte de uma história, e eu, estarei novamente aqui, escrevendo de acordo com as batidas do meu coração, como sempre foi.
Paz para todos vocês.

sábado, 8 de junho de 2013

Um sol que é meu

E não é que o sol nasceu hoje??? Pois é... E me invadiu. Quando abri a janela pela manhã vi que o dia seria cinza e frio. Céu confuso entre nuvens escuras. Ar fechado. Sabe dia estranho? Então... Mas não para mim. O sol nasceu, eu vi.  Apesar do dia feio e nebuloso. Ele nasceu lindo! Forte. Chegou tomando conta de mim, deixando tudo claro e aquecido. Pela primeira vez, em uma semana, as paredes do quarto não me esmagaram quando abri os olhos pela manhã. Nem o teto me sufocou. Nem quis ser engolida pelo edredon. De algum lugar vi uma fresta de luz. Empurrei a janela ainda deitada e vi um sol gigantesco, enquanto olhava um céu triste coberto de nuvens. Há dias meu despertar era uma tortura - olhos desejosos de permanecer cerrados para tudo, coração do tamanho de um pequeno grão e garganta que recebia uma mão invisível a lhe apertar covardemente. Faltava o ar, o ânimo, a coragem. Sobrava afazeres e fé. E eu seguia. Empurrada. Hoje quase flutuei. Senti o cheiro do café que não pude sentir a semana toda. Não, não troquei a marca do pó. Isso se deve, simplesmente, ao fato de que meus sentidos voltaram. Retornei da anestesia. Corri por 1 hora sob o céu azul, quando ouvi "Que ânimo heim Marcela, correndo sob essa garoa". Cumprimentei o vizinho com um sorriso e senti pesar, pelo fato  dele não poder perceber o sol. Corria enquanto sentia meu cabelo molhado pelo chuvisco que mostrava no corpo, a realidade que não era percebida pela minha alma. Ela estava tomada pelo sol. Não sei em que momento isso aconteceu. Se quando fui corrigir as provas dos meus 48 alunos adolescentes do 2º ano, e em uma questão sobre "se existiria um tipo de aula e de professor ideal", e recebi a resposta em uníssono, "sim, você e sua aula". Isso nutre. Mas, sinceramente já ouvi isso de todos eles, de várias formas. Então, pensei se não teria sido pelo fato de ter visto o anoitecer, ontem, no Rio de Janeiro, uma cidade que eu amo tanto! E ter tido a honra de  tomar um vinho, olhando pela janela que tinha como vista, o Cristo Redentor... Mas isso também não é novidade para mim. Então, pensei se não seria pelo fato de ter recebido a chave do meu novo apartamento e, com ela, ver renovada a esperança de uma nova vida. Acho que foi tudo isso, ou,  nada disso. Quem sabe...  Ou pode ter sido, simplesmente, porque minha opção de vida é sempre agradecer a tudo e a todos, por tudo e nada. Acreditar que tudo é como tem que ser.
Talvez seja porque dentro desse inegociável destino, eu possa ver o sol, enquanto meu vizinho, a garoa.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Por quê?

 
Enquanto minha mãe passava por um delicado procedimento cirúrgico, em meados de maio, eu respondia, de dentro do quarto de hospital, um desabafo no instante em que chegou no blog. Foi um ato reflexo. Agora, acabo de  receber um e-mail de Samuel, o autor do desabafo, dizendo que gostaria que "nossa conversa"(como ele se referiu) fosse dividida com os leitores do blog, e, como só faço isso quando sou autorizada, aí segue nossa troca de aprendizado.
E, antes que eu me esqueça, Samuel, há uma frase que gostaria de ter lhe enviado junto a minha resposta, e não o fiz, segue, então, agora. Para você:
"Admiro os resistentes, os que fizeram do verbo resistir carne, suor, sangue, e demonstraram sem espaventos que é possível viver, mas viver de pé, mesmo nos piores momentos." (Luis Sepúlveda)
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"Minha esposa foi morta por um câncer violento que a levou embora em 3 meses. Fomos um "bem-casado" casal durante 14 anos e fiquei exatos 3 anos sem pensar em me relacionar com uma mulher. Conhecia Vera desde a infância e nos reencontramos na saída do cinema, em menos de um ano estávamos juntos. Ela estava recém separada e com dois filhos pré-adolescentes, e foi quem primeiro demonstrou interesse em mim. Com o tempo fui abrindo meu coração para ela, e me apaixonei de verdade. Decidimos que eu manteria minha casa, mas eu vivia mais na dela, que  reformei, aumentei, mobiliei. Dei um carro no primeiro Natal juntos, depois paguei a prótese de silicone, depois comprei um pequeno sítio. Eu tinha bom relacionamento com o ex marido que presenciava o quanto eu cuidava dos filhos dele. Passado um tempo comecei a não poder estar na casa dela quando ele vinha ver os filhos. Depois passei a não poder estar na casa dela porque ele poderia chegar a qualquer momento. Depois não podia mais ir na casa dela, e ela, então, ia para a minha. Comecei a desconfiar do celular sempre desligado, das desculpas para não dormir na minha casa. Um dia um vizinho e amigo me disse que ela estava me traindo. Fui na casa dela e os filhos tentaram disfarçar para eu não entrar, entrei e a peguei no quarto que eu fiz e na cama que eu comprei, fazendo sexo com o ex marido. Se eu tivesse uma arma, teria matado os dois, sem dúvida alguma. Mas graças ao Pai, não tinha. Passei um ano me tratando Ninguém me explicou nada, nem Freud, nem o pastor, nem os livros de auto ajuda, mas encontrei alívio em alguns textos seus. Passei a beber muito mais ainda por não suportar ouvir de toda a cidade "você é um bom homem e não merecia passar por isso". O tempo passa e continuo querendo uma resposta, se ela dizia que me amava tanto, porque fez isso? Nos dávamos bem sexualmente, sei que éramos felizes, eu confiava nela e ela confiava em mim, ela tem muitas qualidades,  e eu sempre exaltei todas elas, sempre estimulei, tentei dar o melhor para ela. A família dela é maluca, mãe vagabunda que traia o pai com o próprio cunhado, Vera foi estuprada por um vizinho aos 17 anos, e só se casou porque a mãe ajeitou esse marido e ela foi obrigada a se casar, e ele ainda batia nela, e ela ainda me traiu com ele. Sabendo dessa vida tão triste eu tentei ser o melhor e o que eu recebi? Traição. Existe explicação possível? Acho que não existe, porque se existisse ela teria me dado eu vejo o sofrimento e o arrependimento dela. Então porque?´"
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"Por que Samuel? Eu também convivo com tantos porquês... será que alguém não os tem como companhia? Olhando de fora a leitura parece tão simples - ela é uma louca, ou vagabunda, afinal quem cometeria a insanidade de trair um homem que cuida, nutre, protege, ama? Ninguém não é? Talvez a lógica fosse essa, mas não é. Tente negociar o seu porque e passe a perguntar porque você sofre tanto por uma pessoa que não lhe quer... Isso sim, olhando de fora ou de dentro pede uma simples leitura - ela não me quis, ponto final. Quando somos abandonados o primeiro impulso é tentar descobrir onde erramos. Não faça isso. Limite-se a aceitar. Difícil? Eu sei. Mas é sábio. Sua dor nasceu de uma decisão de outro, a você nada resta a não ser se resignar. Eu entendi durante a minha vida, na experiência dos meus abandonos, nos vários desabafos que recebo no blog, que a raiva é um imã que fica sempre colada no tapete em que você caiu quando te deram a rasteira. Liberte. Primeiro a si mesmo - você não foi culpado de nada! Era um bom amante, um bom amigo, um bom padrasto. Depois liberte-a - ela é produto de um meio ruim, lembra-se? Generosidade tem um poder abençoado. Experimente. Talvez nem ela tenha a explicação... Provavelmente se ela pudesse, teria feito diferente. Tome isso como resposta.
Os porquês nos adoecem, e eu entendo você. Mas pense nessa frase: "Há uma causa oculta por trás de toda e qualquer enfermidade. Elimine a causa e a doença desaparece." Esqueça os porquês. Em algum momento, a dor desaparece, sim. Creia nisso. E abra espaço porque certamente, outros porquês lhe aguardam vida afora."

terça-feira, 4 de junho de 2013

"Agora sim, eu fui castigada por algo que eu fiz"

Não sei porque o dia de hoje me levou a sentir o perfume do pé de manacá que havia no quintal da casa de meus avós. Acho que foi o céu tão azul misturado com esse friozinho bom, somado a minha ilusão, quase infantil, de que tudo valeu à pena. Seja lá o que tenha sido. Mesmo ciente de que tudo se esvaneceu no ar. Mesmo tendo a exata medida de que não fiz nenhuma diferença, tudo está bem, ou pelo menos, como tinha que estar. Assim como as crianças, fiz o que senti e a bússola, foi só o coração.
Estava na rede ao lado daquele pé de manacá quando meu pai chegou do alto de sua soberania e decretou meu castigo -  uma semana sem pisar na casa da minha avó. Um tiro certeiro. Finalmente, ele achara um modo de me atingir. Seus castigos nunca me abalavam e ele se frustrava a saltar as vistas - "dia das crianças sem ganhar aquela boneca!" E eu nem ai... até que ele entendeu que o verbo "comprar" jamais me afetaria. Pela primeira vez, ele me castigava de fato. Eu tinha 10 anos e dependia da casa da minha avó para respirar. Era o som do seu piano, seus livros, seu português correto e suas histórias que me faziam acreditar que tudo era possível... Que felicidade era paz de espírito. Que paz de espírito era consciência tranquila. Que consciência tranquila era a grata sensação que, independente de certo ou errado, tudo fora feito por amor, com amor e para o amor. Aprendi com ela que a despretensão é algo tão nobre e raro de ser encontrado, quão nobre e raro de ser oferecido. Eu consegui. Não encontrei, mas ofereci. E pude confirmar sua nobreza - ao nada pretender, tudo fluiu, do começo ao fim. Literalmente.
Quis entender porque estava sendo castigada. Eu pedi, chorei, implorei, me revoltei e ele se limitava a responder - "você mereceu e sabe porque". Ocorre que eu nem imaginava... E isso me maltratava. Tem algo pior que ser julgada e condenada sem ao menos saber o motivo? E eu telefonava para ele, mandava bilhete, pedia socorro a minha avó, as minhas irmãs, e nada. Acabara de ser apresentada a um egocrata. E que poder de devastação esses detêm...
Bom, cumpri o castigo, já treinando a humildade - grande aliada. Castigo cumprido perguntei-lhe se poderia saber a razão, e ele, então, me estendeu minha calça de pijama com dois cortes enormes nos joelhos, virou as costas e saiu, me deixando com lágrimas grossas jorrando. Que ódio experimentei ali! É, eu sempre senti ódio quando a injustiça me ronda. E sinto ainda. Mas hoje sou muito mais rosa que espinho.
Jurei que nunca mais deixaria ninguém ser injusto comigo. Inocência...
Minha irmã, com raiva de mim por um motivo que não me recordo mais, cortou meu pijama, minha mãe a castigou e deu por encerrado, mas guardou a calça em seu quarto e seguiu para o retiro da igreja que ela ia sempre... Meu pai encontrou a calça, e do alto de sua soberania, decretou sua sentença.
Fiquei remoendo aquela raiva pequei outra calça de pijama, e fiz os mesmos buracos no joelho com a tesoura. Desci as escadas e o afrontei sem imaginar o perigo que é desafiar um ditador quando se tem a vida ou o coração nas mãos dele "agora sim, eu fui castigada por algo que eu fiz". Ele não me bateu, porque a violência física, geralmente é para aqueles que têm mais sangue do que cérebro, e ainda fingiu que não se abalara, enquanto eu percebia seu ranger de dentes.
Mais uma semana de castigo.
Quando tudo se esclareceu, com a chegada da minha mãe, ele me pediu desculpas, e eu conheci o tamanho do meu poder de desculpar, verdadeiramente. Com o coração. Nem pensei. Enlacei minhas mãos em seu pescoço, ao perceber o quanto ele ficara abalado. Eu não queria que ele sofresse. Não tenho por hábito dar o troco. Não sei onde aprendi isso. Acho que foi sozinha.  E enquanto ele se mantinha, indisfarçavelmente, consternado por dias a fio, eu aproveitava a minha paz.
E é para aquele balanço na rede da casa da minha avó, para sentir o perfume do manacá misturado ao som do seu piano que eu continuo indo sempre que me sinto arrancada de mim.
 

sábado, 1 de junho de 2013

Girando como um pião

A inconstância de tudo é uma grande lição que ainda não aprendi de cor. Sinto-me zonza quando a vida, de repente, me joga de lá para cá. E isso tem acontecido tanto...
Quando sai pela primeira vez do consultório do médico que diagnosticara um tumor no rim da minha mãe, não pensei em nada, apenas me recolhi à minha insignificância e pedi a Deus que não me deixasse perder a fé. Liguei no automático e fui. Mil coisas a organizar antes da cirurgia que seria realizada em outra cidade - faculdade, trabalho, escola, filhos, casa. Tive a impressão de que nada mais teria espaço em minha vida. Mas surpresa, me peguei, como sempre, preocupada com algumas pessoas tão importantes, dando-lhes a atenção de sempre. Eu já sabia que tinha facilidade para me dividir entre dezenas de afazeres, mas fui apresentada ao fato de que também sabia dividir meu coração entre a agonia de filha e a atenção destinada àqueles que já faziam parte da minha rotina. 
Em poucos dias, a certeza de que tudo estava melhorando. Na saída do hospital, finalmente ficou para trás o quarto escuro e a comida sem gosto.
Até que recebi o comunicado, em menos de 10 dias, que outra cirurgia seria necessária, dentro ainda desse mês. Experimentei um transe, enquanto ouvia o médico, em sua patológica frieza, dar a notícia. Enfrentar aquilo tudo de novo... E, antes de pensar nos meus tantos contratempos, para me manter ali, ao lado, havia a compaixão pela dor dela, física e emocional. Hoje fazem apenas três dias que tive essa notícia, e já começo a sentir o gosto da comida insípida e a visualizar o cinza que parece soltar daquelas paredes verdes. Novamente senti que nada mais me importaria. O foco seria esse. Todo o resto eu cuidaria depois. Mas novamente me vi preocupada com aquele a quem já me habituara a zelar. Mas a exceção seria apenas essa, no mais, decidi me recolher em mim. Eu precisava que fosse assim, e por dois dias eu consegui. Fiquei quieta. Não li. Não escrevi. Sequer pensei. Mantive alma e coração em silêncio, buscando toda a minha resiliência e deitando meus "porquês" no colo daquilo que já está determinado. Tentava fazer as pazes com meu destino. Permanecia assim, em estado meditativo quando fui arrancada desse meu "retiro". Privada do meu momento de humildade e aceitação. Precisava digerir, assimilar esse meu sentir, ainda tão confuso... É a filha que sofre misturada ao ser humano que tem compaixão pela dor outro, seja a mãe ou um estranho qualquer.
Ao me recolher, estava tentando racionar todos os meus recursos internos. Poupar sentimentos. Economizar energia. Não desgastar absolutamente nada em mim, me preparando para o que me aguarda. Mas fui privada disso. Mais uma vez invadiram minha vida, me arrancaram do meu sossego e fui pega tão desprevenida que caí e ainda não levantei. Me sinto como um pião que gira sem saber onde vai parar. Justo nesse momento, onde uma mínima escora, já seria luxo para o meu coração. Fui, então, ao único lugar onde poderia encontrar apoio e respostas, mas de onde tirei a ideia de que alguém tem obrigação de me acolher? Outro susto. Mas não culpo, afinal eu também invadi o espaço alheio, entrei derrubando a porta, e, por conta do meu mal jeito, fui convidada a me retirar. Continuo, então, girando sem entender nada do que me aconteceu.  Completamente perdida. Amanhã ou depois, me acho. Afinal, eu sempre me acho. E vou poder seguir em paz. E enfrentar com resignação os dias de quarto cinza, e, conseguir dar o que poucas vezes consegui receber - afeto incondicional.
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