O blogger é atualizado de acordo com as batidas do meu coração. É um prazer tê-los comigo.

sábado, 19 de outubro de 2013

Apenas uma mera exceção

Andava com uma sensação detestável em relação ao ser humano. Um temor imenso de que todo mundo fosse uma farsa e de uma hora para outra eu fosse me decepcionar e sentir dor. E como não queria pensar sobre,  parece que tudo isso criou mais força, dobrou de tamanho e me dominou por inteira, quase me consumindo. A cada dia me isolava mais. Queria meu mundo, meus livros, meus filhos, meu cachorro, minhas músicas e nada mais. Quase me paralisei, tamanha angustia. Após semanas me sentindo assim, decidi que era hora do balanço.
Trabalho naquilo que escolhi e adoro, tenho filhos maravilhosos, um amor tranquilo. Fora essas coisas "miúdas", cotidianas que, cada qual a seu modo, todos vivenciamos, ainda pulsa dentro de mim uma paz que vem da certeza de que  tudo que experimento aqui é só um pedacinho (ainda que muito significativo), de uma imensidão que aguarda a todos nós. Enfim, independente de todos os imensos reveses, tenho uma vida que faz sentido. Acredito no propósito da minha existência. Porque, então?
Aí, deparei-me (obviamente não por acaso) com uma frase de Miguel de Cervantes: "Ah, memória... Inimiga mortal do meu repouso!" Pronto! Estava aí a razão da minha angústia de tantas semanas. Lembranças. Ou melhor, mais do que lembranças,  memórias ainda que aparentemente mortas, vivas a me dominar. E, apesar de não sangrar mais, não me deixam seguir leve. Uma vivência passada com o poder de me manter prisioneira. Fui cruelmente marcada, como se faz com o gado. (Perfeito exemplo...) Diversos pânicos: de experimentar aquela dor de novo, de sofrer a mesma decepção, de levar outra rasteira, de olhar para outros olhos tão falsos acreditando-os sinceros, de que cada palavra que ouço seja mentira, de que tudo seja uma farsa, de que todos sejam também doentes, desses que parecem normais, mas não são. Desses que dão significado à sua existência a partir da dor que causam aos outros. Fiquei com medo de gente, e nem desconfiava disso. Estava sendo injusta, julgando as pessoas, considerando que a distância de todas elas seria mais segura do que qualquer proximidade, por menor que fosse. Nem uma boa conversa consegui engatar com o professor de literatura durante o jantar da escola. Começo bem, mas em 15 minutos já imagino que ele está ali tentando me impressionar, me manipulando com a finalidade de atingir um objetivo previamente calculado. 
Temi estar surtando. Um namoro bom (pelo simples fato de me fazer muito bem) que quase jogo pela janela porque me embrulha o estômago ao ouvir o que toda mulher adora - frases apaixonadas. Eu passei a recebê-las como um punhal venenoso - a poderosa fala articulada, desprovida de qualquer significado, dita em toda esquina a qualquer uma. Peço-lhe, então, que não as diga a mim, juro que não gosto de ouvi-las, explico que prefiro apenas viver  aquilo que seria dito. E ele não entende, claro. Mas respeita, até que em um momento qualquer, as emoções vêm à tona e ele diz. E nesse momento eu quero ir embora. Eu apago onde todas acendem.
Retornei à terapia. E ouvi o que já sabia. Sofri um trauma. Para falar a verdade não me conformo. Já passei coisa demais na minha vida para aceitar que aquela experiência tenha tido o poder de me causar tamanho mal. Casamentos desfeitos depois de décadas, projetos no ralo, vida recomeçada, e eu, sempre forte e cheia de esperança. Tinha que haver uma explicação para tamanho estrago. Não poderia perder a fé no ser humano. No amor. Na amizade. Na lealdade. Não poderia me perder, perder a minha boa fé por causa de uma breve história. "Breve história, mas com o poder de destruição de uma bomba nuclear pelo fato de ter como protagonista uma pessoa que não é como eu e nem como você." Bastou ouvir isso da minha terapeuta, após 7 sessões para que eu me desse alta. Resignifiquei tudo. Agora creio que possa seguir por outro caminho. Resgatando meu bom senso que sabe que não posso condenar a humanidade por conta de uma exceção... Cruel demais, é fato, com alto teor de periculosidade, também é fato, mas ainda assim, nada mais do que uma mera exceção entre os milhões de seres humanos.

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Bendito seja o tempo.

O poder do tempo ainda me causa espanto... Não me acostumo com a mágica que se dá no passar dos dias! Tudo se ajeita, se encaixa, se reconstrói...Se enterra, se apaga, se desfaz... Um eterno fluir...E a gente segue, nunca o mesmo, mas ainda assim, caminhante... perdemos a firmeza, tropeçamos, caímos, levantamos, vamos claudicando, até que novamente nos sentimos seguros. E ele ali... o sol nasce e se põe em uma rotina irritantemente sistemática, tão diferente da inconstância que é viver. Quando me lembro de algumas perdas, decepções, traições que vivenciei, posso (re) sentir os sentimentos... tanta mágoa, tristeza, susto... tantas indagações... tempo congelado em minhas angústias, e eu podia jurar que ficaria assim para sempre. Olhava para a cena da minha vida, olhava para mim e para aquele que me arrancou de mim mesma, e era como se um artista tivesse reunido as mãos, pés, cabeça e outros membros de imagens de diversos modelos, cada parte muitíssimo bem desenhada, mas sem relação com um mesmo corpo, uma vez que elas não se adaptavam umas às outras de forma alguma e o resultado era antes um monstro que um ser humano.
Quando meu ex-marido me deixou sem dar o mínimo sinal de que faria isso, de início, o susto foi maior que a dor. Estávamos até o último minuto de mãos dadas. Dormi de conchinha, fiz amor como sempre foi, escutei "eu te amo" até a véspera, acordei para um dia comum e, depois do beijo de bom dia, escutei um "estou indo embora". Foi uma tragédia. Literalmente. Tragédia que se perpetuaria por meses a fio em um torturante ir e vir... Ele ia sem ir, ficava sem ficar. Sumia para longe e quando voltava parecia que nunca tinha ido. Tudo era igual. O afago, o afeto, o sexo. Eu não via nenhum sinal de certeza... em seus olhos nada além de lágrimas constantes.. Beijos ardentes, abraços sem pressa. Ainda assim, ele ia. Eu contava que um dia ficaria por lá. Mas novamente vinha para cá. Até que o fim chegou definitivamente, não sei partindo de quem. Vida desfeita. Sonhos em cacos. Projetos que viraram pó. Futuro? Dias sem poder pensar no significado dessa palavra. Como dizem por aí, passei dias fazendo o parto da minha dor. Foi dilacerante! Mas passou. E nem me dei conta de como essa mágica aconteceu... O fato é que eu jurei jamais me deixar magoar novamente. Parecia impossível retomar a boa fé nas pessoas e no amor, após tamanha traição. Mas... o tempo se encarrega de levar as sombras, e de repente... estava eu, acreditando novamente. Contei minha história, confessei meus temores, pedi seriedade, implorei por sinceridade. E, após sucessivas promessas de amor, e como toda promessa, orais e não factuais, e após sucessivos olhares apaixonados e cenas explícitas de amor verdadeiro (momentos intensos e nada mais) me despi completamente e fui... Senti-me a única entre as mulheres - a amada! Enfim, "a" escolhida! E me regozijava perante as preteridas, ainda que discretamente. Mas pairava uma dúvida sobre o caráter daquele amor em questão, e ela zunia em meu ouvido como um inseto, incomodando minhas certezas inventadas. Sacudindo à minha frente evidências que quase arrancavam de vez aquela ilusão. Mas ele não deixava. E jurava, e (re) jurava e (re) (re) jurava. E eu, ficava. Um dia, veio o adeus... Sem molduras, sem contornos, sem a mínima explicação que confortasse. Minha alma parecia corrompida. A maldade alheia tem esse poder. Corrompe. Novamente foi como se o solo debaixo dos meus pés tivesse sido retirado, sem que nenhum fundamento firme, sobre o qual eu pudesse construir, estivesse à vista. Onde me agarrar? Outra vez o susto foi maior que a dor, até o momento que o espanto deu lugar ao sofrimento. E foi intenso. Dessa vez não tinham projetos desfeitos, porque mal tinham projetos, a não ser uma cadeira de leitura na varanda do 4º andar, e nada mais. Mas tinha a minha boa fé... Eu me traíra, eu me colocara em risco, eu estava ali, de novo, em menos de dois anos, em um sofrimento dilacerante, simplesmente porque cedi ao acreditar que o outro era... era o que? Sei lá... acreditei que era... Que era o que me dizia ser. Naquele momento e nos outros que se sucederam eu me via mais uma vez em terrível confusão. De qualquer modo, para mim foi muito difícil. Gostaria de ter-me tornado um palhaço de circo, um andarilho, um capitalista selvagem, ou algo do gênero e nunca ter pensado sobre amor e muito menos vivido ou acreditado nele. Mal podia conter a raiva que sentia de mim mesma... outra vez eu tinha a paz roubada. Eu tentava me reerguer enquanto os fantasmas, resquícios dessa história, me assombravam sem parar. Maldisse a tecnologia. Queria anonimato absoluto. Não conseguia. Comecei a jurar àquelas que me assombravam, que fora tudo uma brincadeira - que nunca houvera amor. Que me enganara. E disseminei essa ideia onde pude. E foi assim que consegui que me deixassem em paz. Pude me recompor. Menti imensamente. Só eu "e outros eus de mim" sabíamos o tamanho e a veracidade daquele amor. Foi um grande amor. Um amor que também passou. Ou melhor, que precisou passar.
Foi tudo tão doído que desejo do fundo do meu coração, hoje, que aquele que me machucou não seja jamais machucado na mesma proporção, simplesmente porque eu tenho a graça do tempo ao meu lado, e pode ser que ele não o tenha. "Mas o tempo não é generoso com todos?" Não... não é. O tempo, como tudo, só trás benefícios para quem tem olhos para ver. Eu tenho. Graças à Deus.
Assim, com o parco poder de minhas vibrações, desejo àqueles que me machucaram, dias claros, encontros verdadeiras, pessoas boas, e uma consciência bem tranquila que lhe dê a paz que me tiraram, mas que o tempo, com sua graça me devolveu, e eu, com a minha graça pude aguardar sã e salva. Bendito seja o tempo...
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