O blogger é atualizado de acordo com as batidas do meu coração. É um prazer tê-los comigo.

sábado, 21 de abril de 2012

Álbum de retrato

Pediu-me que guardasse, por tempo indeterminado, o álbum de fotografias que montou  durante os 3 anos de namoro. "Nunca mais terei coragem de abri-lo" disse aos prantos. "O tempo se encarregará disso, meu bem". Abracei-a forte enquanto soluçava.
Ele havia terminado aquela relação de forma descuidada. Sem arremate algum. Colocou o ponto final sem  direito a interrogações. Com o tempo ela iria superar, mas naquele instante, sua dor exalava, me contaminando. Ela uma adolescente, eu uma quarentona. Não percebi diferença entre nós duas. Dormi chorando noites seguidas pensando no sofrimento dela. Sempre me penalizei pelas dores de amor (e olha que ainda nem havia provado o gosto). Era como um velório. Eu ia diariamente até sua casa e ficava ali - eu e sua mãe, uma de cada lado - mãos dadas com ela. Não falava, não xingava, não reclamava. Só se ouvia soluços entrecortados. Tudo baixinho, como as mães gostariam que seus filhos pequenos fizessem. Um rio de lágrimas. De vez em quando soltava minha mão e enxugava o rosto com um pequeno lenço de linho branco, bordado com sua inicial (aquilo devia ser presente de avó). Eu saía dali moída. Era dilacerante ver toda aquela juventude, o sorriso largo, ainda sem disfarces, conhecendo o fim de um amor. Queria matar aquele namorado! (Que por acaso era o meu filho). 
Nunca perdemos contato. Passados quase dois anos ela me conta que está apaixonada e muito feliz. Quer saber que dia pode marcar para apresentar-me ao novo namorado. Perguntei se não era hora de pegar de volta o álbum de retratos para guardar como lembrança. 
"Que álbum?" 
Ela se esquecera. Corações seguem sem olhar para trás. Custa muita lágrima e demora o tempo do tempo. Mas depois vira apenas álbum de retrato. Ou nem isso.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Depois de Depois, vem a Manhã de Sol


Passada a fase da música "Depois", abro a janela para a "Manhã de Sol"(tô quase lá,Van!).

                                        DEPOIS
                                                                      (marisa monte)



MANHÃ DE SOL
(amaranto)


Parece que tudo vai mudar
Tomara que seja pra melhor
Parace que a gente vai cantar
Quase que uma canção de amor
Ontem eu pensei que amanhã seria só um vendaval
Hoje eu acordei numa manhã de sol
Nesse sol eu vou ...

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Eu, Socorro e tantos vocês

Li o texto que transcrevo abaixo no blog Seguindo minhas pegadas  da querida Socorro Melo. Nunca vi uma dor  descrita com tanta objetividade. Me senti amparada. Por breves segundos tive a sensação de que ela havia escrito para mim, aí entendi o que sempre soube - não sou a primeira e nem serei a última. Todos navegamos nesse barco de papel chamado amor e ao virar a esquina de uma história haverá sempre o risco de qualquer coração bater no poste e se acidentar gravemente. Mas há cura e chama-se tempo. Em uma decisão tranquila de virar a página, começo a me despedir dessa fase de exposição das minhas feridas vivas. E gostaria de iniciá-la deixando esse texto que retrata a dor experimentada pela Socorro, por mim, e por tantos "vocês".  
Quando ele cruzou o limiar da porta, e o vi pelas costas, levando consigo os meus sonhos de um amor ideal, minhas esperanças de uma vida perfeita, minhas ilusões, desmoroneiO chão abriu-se sob os meus pés, e me senti tragada. Estava tudo acabadoA desilusão fechou-me as portas da alegria, e da vontade de viver, e abriu-se uma torrente de lágrimas. Eu mal conseguia acreditar que pudesse ser verdade, tudo o que estava me acontecendo. Por vezes fechava os olhos, na esperança de ao acordar, constatar que tudo não passava de um terrível pesadelo... Mas, não eraA vida perdera as cores, tudo me parecia cinzento, sem sentido. Desaparecera o brilho dos meus olhos, e eu já não ouvia a música suave que cantava o meu coração. Desmoronei. Que dor lancinante! Nunca imaginei que o desespero causasse uma dor tão doída e tão profunda... De angústia e tristeza foram pincelados os meus dias. E o meu coração inconsolável, gemia, inconformado pela perda, e pela saudade incontida.Tudo em que acreditei, tudo o que investi, tudo que mais amei, se dissipava da minha vida como fumaça ao vento. Caí, me prostrei. Expus as feridas da minha alma. Deixei me conduzir pela solidão. Debati-me à procura de veredas, de caminhos amenos, porém, nada aplacava a minha dor. Por momentos tornei-me fria, insensível, para logo depois, tatear a procura de esperanças, e de paz interior. Sofri horrores, por dias que pareceram sem fim. E me permiti ficar assim, até me esvaziar por completo de toda dor, e perceber que a vida é mais que o desengano. Mas aprendi, às duras penas, e o desengano me fez compreender, que a vida é tecida na imprevisibilidade, por pessoas falíveis, com qualidades e defeitos, e que, portanto, está sujeita aos desencontros, e desencantos.


quarta-feira, 18 de abril de 2012

Na carona de cada estação

O sol de hoje me pareceu mais claro e forte que os outros dias. Ao senti-lo bem cedo pensei "e aí rapaz, acho que hoje você nasceu só para mim". De fato a energia foi poderosa, e me deu coragem para tocar na saudade. Matei-a da nossa maneira. É bom deixar-se guiar pelo desejo imediato, como se não houvesse amanhã. "E na verdade não há"
Em seguida percebi que esse sol diferente é o prenúncio do inverno. Entendi porque a saudade hoje acordou maior. Pude sentir o aroma do café que você coava cedo, enquanto eu, tantas vezes, me encostava no beiral da porta da cozinha e te olhava com tanto carinho... de costas, casaco preto farto, mãos no bolso, esperando a água ferver, e eu pensava antes de te entrelaçar pelas costas, no quanto te amava. Depois tomávamos café e pão de queijo (a única mineirice que te pegou) - nunca vi gostar tanto do tal do pão de queijo! 
E mais um inverno vem chegando. E outro verão se vai...E vou descobrir como conviver  com as nossas boas lembranças, que vão pulando como pipoca sobre mim - com gosto, cheiro e graça, na carona de cada estação. 
Mas "com as primaveras aprendi a ser cortada para renascer"(ainda não aprendi, mas vou aprender).

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Respira fundo...

O dia amanheceu noite. Nuvens carregadas de chuva tanto quanto eu de lágrimas. Mas não choramos, nem eu, nem a nuvem. Não deu tempo de espreguiçar (há meses não tenho esse momento gostoso, por falta de gosto). Desde que vi meu mundo ser drasticamente reduzido, não sei se durmo ou cochilo. Acordo mais cansada que deitei. Imaginei as 24 hs que teria pela frente e elas me pareceram insuficientes para tanta vida que urgia dentro da minha falta de vida. Estágio às 7 da manhã. Acorda o filho mais velho para deitar-se com a caçula para  que não se assustasse ao acordar sem ter minha presença em casa. Basta de sustos para ela. Conta de luz para pagar antes das 10 da manhã. O filho liga preciso ir trabalhar, mãe. Corro para casa, ela pede leite. Não tem nem uma caixinha! Corro no mercado. Preciso ir ao banco. E quem disse que o tal dos gêmeos Zack e Cody me deixam a chance de convencê-la a ir comigo? Deixo-a só em frente a TV.  Nunca fiz isso. Queria ter asas para tantas coisas ultimamente, mas nesse momento só para ir ao banco já estava bom. Uma montanha de roupa para lavar. Minha ajudante de mais de 20 anos talvez não volte mais. Onde está o sabão em pó? Não encontro em canto nenhum. "Mãe, o Hugo fez cocô em cima do sofá"( Hugo é o cachorro). Volto ao mercado. Coloco as roupas na máquina. Meu estômago se contorce de tanta dor. Me dei conta que não comi pela manhã. Antibióticos me detonaram. Não dá para "encarar" comida de restaurante, portanto: cozinha! E o cheque? Não acredito! Esqueci, preciso resolver isso. Sinceramente nem imagino o que fazer. Deixar feijão cozinhando com uma criança sozinha na sala ao lado? Nem pensar. Minha filha, por favor, vamos comigo é rapidinho. Nem pensar. Desligo o fogão. Em 20 minutos estou de volta. Retorno o feijão ao fogo. E o dever de casa? Me distraí. Nova luta. Dever pronto. Um relatório de estágio precisa ser entregue até às 14 hs. Vou conseguir. Respira fundo...
Almoço na mesa, merenda arrumada, uniforme limpo. Trânsito parado. Acidente de carro. Perdemos o ônibus escolar. Ok. Respira fundo de novo. Engarrafamento e meia hora depois, estou de volta. Cozinha um caos. Tiro roupas da máquina. Esqueci o relatório! Às 14hs e 10 min entro no site da faculdade para enviá-lo "prazo limite ultrapassado". Ok. Perdi mais essa. Dia continua escuro, a tempestade não cai. Caio eu em prantos. Breve pranto. Tenho que depositar o tal cheque no banco. E lá vou eu. Fila.Chego em casa  e percebo de uma forma singular que eu posso. Independente de muitas coisas e pessoas, eu posso. Não consegui tudo - não consegui consertar o varal e nem achei quem o fizesse, não consegui forrar com lençol a minha cama porque meus rins ainda "gritam" de dor e não há ninguém por perto a quem pedir que faça por mim o simples ato de forrar a minha cama. Mas só a minha tentativa em toda essa nova luta já é uma conquista. Olho em volta e em meio a tanta bagunça que ainda não consegui arrumar, deparo-me com restos. Não refiro-me aos fragmentos de uma história.  Refiro-me a restos, a parte que não valeu à pena e que tortura e precisa ser queimada (afinal, raspas e restos não me interessam). No mais, vejo vida me aguardando para ser vivida.

domingo, 15 de abril de 2012

Desencanto

Dando continuidade à deliciosa  blogagem coletiva "Amor aos Pedaços" aqui estou eu, participando da fase Desencanto. Tudo coincide comigo - estou aos pedaços e vivi um imenso e inesperado desencanto. Participo, com uma carta que escrevi endereçada à dor que me consumiu quando o desencanto bateu a minha porta, lá pelos meados de novembro.


Caríssima dor,
você deu sinais que arrombaria a minha casa, e eu não vi. Quem viu não me avisou. Mas aqui nunca teve espaço que fosse seu, e nunca terá. Você tem péssimos hábitos - roda para lá, roda para cá e vai lanhando objetos e pessoas, enfiando farpas agudas. Uma hora é o armário que surge sem um pedaço, outra hora é minha carne. Armário não sente dor, sua burra. Só eu. E sangro. Armário só serve para guardar pertences, já eu faço parte e tenho minhas partes em muitos pertences, meus e alheios. Ou tinha. Você maltratou minhas certezas. Roeu um círculo no chão sob minha poltrona preferida.  Esperou o momento em que lá eu me aconcheguei com algumas certezas e um livro entre as mãos e enterrou seus dentes afiados no último ângulo que faltava. Fomos sugados: o pedaço do chão, a poltrona e eu, distraída, pensando na última frase lida: "quem escreverá a história do que poderia ter sido". Ainda estou em queda livre, agarrada a Fernando Pessoa, sua frase ecoando dentro e fora de mim, sem saber onde vamos chegar. Minhas certezas? Coitadas... E olha que eram poucas, muito poucas. Mas eram minhas. Apostei tão alto! Quebraram a banca com apostas de um vida inteira.  Onde foi parar minha fortuna... Felicidades, sonhos, projetos? Sei lá... devem estar por aí com a poltrona...Ou estariam com você?  Mas para nada te servirão, enquanto eram meus esteios. Proponho um acordo. Não sei se será bom para os dois lados, porque para você nada parece bastar... você espreme meu coração, corrói meu estômago, finca a minha garganta, leva meu sono, rouba minha paz, e só quando molho todo o colchão (porque o travesseiro não lhe basta) é que você me dá um segundo de trégua.  Esses dias você tem sido monstruosamente maior do que eu, me engolindo com facilidade. Não sei se é esse mesmo o seu tamanho. Mas sei que não é o meu. Não sou pequena, não encolho, nem me submeto. Sou forte e grande como um leão. Nem queira conhecer minhas garras. Melhor, então, fazermos o tal acordo. Aprendi com você (e para sempre), a não ter certezas, como escreveu minha amiga Vera Alvarenga: "o único sentimento que conheço é o meu". Aprendi a prestar mais atenção aos sinais que chegam silenciosos e aprendi que sou do tamanho que me vejo. Dessa forma, te aceito, te agradeço e te libero. Pode ir. Nosso acordo é que eu não te alimento mais. Nem uma lágrima está ouvindo? Mas te reverencio até o fim, e contarei isso ao mundo todo (será que você é vaidosa? Torço para que sim). Reverencio o seu poder, seus sábios e dolorosos ensinamentos.
Finalizo essa carta, fazendo minhas as palavras da  querida Kátia.

“Estou saindo sem levar as chaves. Portanto, deixe as portas abertas, bem como as janelas também. Quero arejar o quarto. Quero aliviar-me de sua presença que me custou muitas noites de insônia e abundantes lágrimas. Saia sem deixar marcas... E...por favor...Não me procure nunca mais...
Respeitosamente,”
Marcela

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Outro eu em mim

Algumas vezes (como hoje) queria que habitasse outro eu em mim. Fico imaginando o que seria, se eu fosse diferente de mim. Tantas modos de ser eu poderia ser. Evitaria tantas coisas e causaria tantas outras (isso é certo). Mas se pudesse, queria experimentar. Olhar com outros olhos, ler outros livros, pensar menos no que poderia ter sido e mais no que poderia ser. Se eu tivesse outra motivação talvez sentaria mais em bares e olharia menos para o céu. Com isso veria mais pessoas e menos constelações. E se eu ficasse feliz em ganhar uma aliança de diamantes azuis e achasse brega receber uma rosa com um cartão e um poema? Seria diferente. E se eu chorasse só porque meu filho repetiu o ano na escola? Outra novidade.Como deve ser não ter vontade de chorar quando seu filho pega o ônibus na rodoviária para estudar em outra cidade? Nem imagino... Mas queria saber como é sentir tantas coisas diferentes dessas que eu sinto. Queria não saber fazer bolo de banana e gostar de churrasco e cerveja. Queria não estragar todos os meus sapatos com menos de um mês de uso. Se eu fosse outro eu, ainda assim investiria nesse mesmo amor. Porque valeu à pena e eu não sei amar diferente. E se eu soubesse amar pela metade? Acho que sofreria menos (olha, te amo se você fizer isso, se você me der aquilo, se você se comportar assim...). Eu amo porque amo. Se eu não fosse esse eu que vejo agora refletido no espelho, mas esse outro eu que meus olhos procuram, queria ter menos livros e ver todo mundo em minha volta voltando a ser feliz. Não, não é culpa dos meus livros. É só vontade de ser diferente. E só vontade de que tudo não tivesse mudado de lugar.

terça-feira, 10 de abril de 2012

Um sol para mim

Esqueci o temor de insetos e dormi com a janela do quarto totalmente aberta. Fui desperta pelo sol. Era muito cedo quando ele tocou meu rosto. Diferente de mim, parecia saber onde ir. Fiquei observando e rapidamente invadiu a cama, deixando o cabelo de minha pequena (é, estamos dormindo juntas só por um tempinho, prometo) dourado como quando ela nasceu. Por breves momentos me senti quase feliz. Aquela tristeza monstruosa deu licença ao sol. 
Ainda tenho a sensação irracional de que a alegria me abandonou para sempre. Ando obtusa e, como estou consciente disso, nem dou "bola" aos temores que me assombram. 
O sol continuava brilhando lá fora quando, sem mais nem menos, fez-se noite novamente dentro de mim. Acho que foi o toque do telefone. Não sei. É uma sensação ruim. Parece que o mundo pára de girar e se concentra nessa dor que esmaga tudo, obrigando o coração a se agarrar para não ser cuspido para fora de peito. Aprendi a dar licença a todos os sentimentos que me visitam, pois estou convencida de que, mais dia, menos dia, todos vão embora para sempre. É o famoso e perfeito "tudo passa". Tudo mesmo!
Novamente me fixei no calor do astro. Descobri que é diferente chorar sob o sol. As lágrimas secam mais rápido. Decidi acompanhá-lo mais de perto. Fui caminhar. Em meia hora não se via mais o sol. O céu ficou escuro. Mas eu optei por mantê-lo o resto do dia vivo dentro de mim, e espero conseguir.

domingo, 8 de abril de 2012

Sem escolha

Perco coisas e pessoas com uma frequência que judia e me sufoca. Enterrei em cemitério uma ou duas pessoas que me eram caras.Velei poucos mortos. Mas enterrei muitos vivos. Pessoas queridas que me deixam para trás. Choro por longo tempo essas perdas, em um velório sem corpo e sem velas. Meu lamento é solitário. Minhas perguntas, sem respostas.  Forçam-me a jogar projetos na lata de lixo. Escondo de mim mesma porta retratos para nunca mais encontrá-los. Idealizei tantos cenários para depois desmontá-los. Outra vez tenho uma vida abortada. Mais uma vez me metamorfoseio para me adequar ao que não tive escolha. Fecharam a cortina antes que eu tivesse terminado minha fala. Existe um mundo que depende de mim e precisa seguir. E eu o seguro (e ele me segura) e vamos adiante. Me equilibro com extremo esforço para não cair, enquanto todo o resto parece alheio ao peso que me impõe. Novamente ninguém para me escorar. E um mundão para enfrentar. É a vida que segue. 

sexta-feira, 6 de abril de 2012

As pegadas do coelhinho

Enquanto eu escondia os ovos, o pai fazia com dedos e farinha, as "pegadas do coelhinho". Um dia Clara entendeu que poderia escolher o ovo diretamente na loja, sem precisar esperar ansiosamente pela chegada do animalzinho e nunca mais fizemos esse delicioso ritual.
Ontem ela encontrou os ovos de páscoa guardados no meu armário. Pegou um por um, olhou, perguntou para quem era esse e aquele. Depois virou-se para mim e disse "Mãe, domingo você faz com seus dedos as pegadas do coelhinho para eu encontrar os ovos"? Senti-me nocauteada. Em uma cumplicidade dolorida, sorri para ela com vontade de colocá-la no colo. Devolveu-me o sorriso, e desconfio que tenha tido também vontade de me oferecer seu colo. 
Pela primeira vez vamos enfrentar o domingo de Páscoa sem que a nossa família esteja completa. Ainda não sei que sabor terão os chocolates. 
Traduzi seu pedido inocente como "Mãe, vamos fazer de conta que nada mudou?" Mandei às favas meu usual discurso chato e politicamente correto de "Nunca devemos mascarar nada" "É preciso enfrentar" "A vida é para quem tem coragem". Hoje quero fazer de conta também. Fechar os olhos e sentir que estamos juntos outra vez. Criança fantasia para elaborar sua dor. Quem sabe aprendo com ela?   E enquanto ela procura e eu finjo que ajudo, vou rezando para que nesse dia de renovação, possamos encontrar junto com os ovos, a paz, a coragem e a tranquilidade para enfrentarmos juntas esse caminho diferente e incerto, sem a companhia daquela pegada firme que nos amparava, com quem compartilhávamos a vida com tanto prazer, e  tinha um "ar de para sempre" tão grande... Domingo vou acordar mais cedo, vou fazer as pegadas e vou esconder os ovinhos, como você pediu, meu amor, e vamos tentar ter um dia feliz, mesmo faltando um pedaço.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Reformulando a vida

Coisa difícil é o recomeço. O sol nasce indiferente ao seu sofrimento dilacerante que, por acaso, não é maior e nem mais importante do que o de ninguém. Olha em volta e tudo está no mesmo lugar, só você que está vivendo um caos particular. E independente disso o mundo segue ligeiro lá fora. Hora de se organizar - há uma pessoa a menos na sua rotina. Uma pessoa tão fundamental... Que como um pássaro engaiolado, voou para longe desse ninho que por tanto tempo, foi só de amor... Deixando você partida em pequenos cacos... E ainda assim é preciso decidir qual o novo horário que o despertador precisará tocar para que você dê conta do dever de casa, do almoço, das várias aulas que consomem toda a parte da manhã em um exaustivo leva e trás. Além disso tem a "guerra" do almoço - come, não quero. Tem que lembrar da merenda.Tentar não perder o ônibus da escola. Buscar à tarde ( e sempre levar uma coleguinha para brincar em casa). E aí tem mais - psicóloga, teatro(essa é novidade!) e ver a bisa de 92 anos que cobra a presença. É  preciso ficar atenta ao intestino da filha que não funciona bem - ter o cuidado de fazer uma salada de fruta (detesto picar frutas!). Uniforme precisa estar limpo. E tem o cachorro: levar para tomar banho, sair para a volta diária com o bichinho (prometo!) e tem o filho que mora fora, e tem o outro que quer conversar sobre a namorada. E ninguém mais para dividir tudo isso com você. Até outro dia tinha, agora não tem mais. Preciso começar minha caminhada diária. Dar conta da faculdade. E o estágio? E  ainda tem aquele bom dia sorrindo (nem que seja de vez em quando), jogar UNO com a filha, assistir Disney na TV, fingir que está feliz e responder de boa vontade as infindáveis perguntas que ela faz sem parar, enquanto um britadeira poderosa parece que vai te furando inteira, sem trégua,  de tanta dor que vaza por todo canto, enquanto você repete em pensamento: "vai passar, vai passar", e segue tirando força da crença de que a vida é mais do que isso que vemos por aí. E tem a cama vazia à noite, e tem um lugar a menos na mesa de almoço e tem o desejo de que essa reformulação de vida fosse apenas um terrível pesadelo, e que ao acordar, tudo continuasse no mesmo lugar. 
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