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terça-feira, 19 de novembro de 2013

Félix, determinismo e livre-arbítrio

 
Acordei hoje com uma sensação ruim deixada pela cena de ontem da novela das 21hs. Matheus Solano em uma impecável atuação quase me fez esquecer que era apenas o personagem de um folhetim (como se nossa vida fosse algo mais que um folhetim...).
Passei décadas da minha vida acreditando que gente assim só mesmo em novela, até que o destino determinou que meu caminho se cruzasse com uma pessoa exatamente assim. O ser humano tem tanta mania de nomear e enquadrar tudo que não consegue explicar, que já decidem que quem é mau caráter, frio, calculista, dissimulado, indiferente ao sofrimento alheio, é sociopata, psicopata e um monte de “ata” por aí. Não dá simplesmente pra dizer que é personificação da maldade? Já que não tem cura mesmo, de que adianta dar nome?
Muitas vezes, em minha vida, questionei porque Deus permitia a existência da maldade em sua criação (e, sem essa da história da Eva e da maçã!). Santo Agostinho se martirizava pensando: “Mas se o mal é criação do homem que é criatura de Deus, então há relação entre Deus e o mal?”
De onde vem o mal? Porque existe gente má?
No caso do Félix ficou retratado em seu desabafo, o quanto o meio familiar desajustado é capaz de danificar o caráter. Será que os pais tem a exata noção do quanto o desamor e a desatenção destinado aos filhos podem fazer destes, futuros monstros, uma máquina de detonar vidas alheias, ainda que não seja jogando bebês na caçamba de lixo, seria jogando vidas de pessoas que não lhes são mais úteis nessa mesma caçamba?
Santo Agostinho tinha pai pagão e mãe cristã fervorosa, criando-se assim, em um meio dualístico. Na adolescência se desvirtua moralmente caindo em profunda sensualidade que, segundo ele, é uma dos maiores consequências “do tal” pecado original. Nesse momento ele adere ao Maniqueísmo que atribuía realidade substancial tanto ao bem quanto ao mal, confirmando assim, o que viveu, achando no dualismo maquineu, a solução para o problema do mal, inclusive do “seu” mal, justificando assim, o seu problema, e certamente a sua culpa. Ao se converter ao cristianismo refuta veementemente o maniqueísmo e passa a defensor ferrenho do libre arbítrio, crendo ser o mal, fruto da liberdade humana mal utilizada. Seria sempre assim, as pessoas tornam-se juízas do lado que lhes é mais conveniente? Não seria isso oportunismo? (até mesmo de Agostinho...).
Felix joga sobre o pai a responsabilidade  pelo monstro que se tornou. Todos os que são lúcidos atribuem a culpa ao meio familiar e social para justificar as monstruosidades que seguem cometendo. “Olha eu te engano, eu minto, eu te faço mal, mas não tenho culpa porque o meio em que nasci e me criei foi responsável pelos impulsos que tenho hoje, sinto muito(sente porra nenhuma!) mas vou te fazer mal." E vamos jogando bebês em caçambas de lixo porque o “papai” não me amou como deveria.
Segundo um estudo recente da neurociência funcionamos na base do acerto e do erro, e da cópia do comportamento das pessoas próximas – principalmente dos nossos familiares. “Por isso a educação das crianças é tão importante. É um momento onde o cérebro absorve uma carga de informações, está sendo moldado, criando parâmetros para saber como se portar, como viver em sociedade.” Sob essa perspectiva Santo Agostinho teria seu livre arbítrio jogado ao lixo.
Ainda estudando muito, eu já quase posso afirmar que a minha crença de que Agostinho estava mesmo errado, e que vivemos em um universo determinista. Mas ainda assim, há de se ter um modo de sermos responsáveis por nossos atos. Caso contrário o caos estaria instalado! Imagina se todos pudessem matar, roubar, mentir, constituir família com dezenas de mulheres, ceder a todos os seus impulsos sexuais animalescos com base no argumento simplista “o meio me impulsionou a agir assim.” E enquanto isso bebês morrem dentro de caçambas, pessoas são roubadas de sua paz, mutiladas em seus sonhos. Ridículo! E covarde!
Como descreveu Cássio, em Júlio Cézar de Shakespeare: “Há momentos em que os homens são donos de seus fados.” Assim como alguns os neurocientistas, creio que o livre arbítrio seja uma ilusão, mas uma "ilusão necessária para a ética" (afinal o que não é ilusão?). Independente de estarmos em um cenário determinista, temos um cérebro, e ele não poderá ser desprezado “porque papai não me amou”, “porque mamãe me abandonou” “porque passei fome”, “porque sofri abusos” e etc. Somos dotados de um cérebro e é ele que pode e deve conduzir nossas ações. Caso contrário, para sempre o mal justificará o mal, o mundo jamais terá chance, e o ser humano estará condenado por toda a eternidade, e, creio que nisso, Santo Agostinho tinha razão – o homem é bom em essência, portanto um dia, estaremos todos ao lado de Deus, inclusive os Félixs, Pedros, Paulos, Antônios, Anas...
 
 


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