Assistindo pela primeira vez uma determinada novela,
fui "apresentada" a um jovem casal, pais de um bebê, justamente no
dia em que a moça decide separar-se do marido. Entendi que se casaram
apaixonados, mas ele, médico recém formado e visionário, lhe oferece uma vida
aquém do que ela deseja. Ela trabalha em uma loja de roupas onde convive com
pessoas ricas e almeja para si, a mesma vida de luxo, conforto, roupas de
grife, carros, jóias. A conversa com o marido é franca e direta - cansei
dessa vida de contar dinheiro, de não poder entrar em uma loja e comprar o que
eu quero, de viver em um apartamento apertado, de ter que chegar em casa e
passar roupa. Não é isso que sonho para meu futuro. O marido devolve
dizendo que nunca lhe faltou nada. Que sempre chegou em casa a tempo de dividir
com ela todas os afazeres domésticos e as obrigações com o filho. E fiel às
suas prioridades (opostas às dela) ele ainda argumenta - durante esses anos
fiz de tudo para te ver feliz, sempre te dei toda atenção, amor e
carinho. Sentiu-se sozinha? Faltou-lhe prazer? Algum momento falhei como
companheiro? Chorando ela responde que não, que ele sempre foi perfeito,
que ele é um homem maravilhoso, culto, honesto, generoso, amigo, bom amante,
enfim, tudo o que uma esposa pode desejar. E ele, então, diz que não entende
porque ela quer se separar, e ela define: a falta de dinheiro fez vencer
nosso prazo de validade. Pede desculpas ao marido que fica chorando, e diz
que tentou, mas não conseguiu ser feliz com aquela vida. Deixa o filho sob os
cuidados dele e vai-se embora.
Cabem julgamentos? Para minha reles condição
humana caberiam vários... Mas, como estou buscando me tornar uma pessoa melhor
e maior, vou abster-me de qualquer um. Apenas digo o de sempre - prioridade é
para ser respeitada, e "burro" daquele que não prestar atenção à sua e à do outro antes de
tomar a importante decisão de construir uma família. Amor não sobrevive a
sacrifícios. Amor precisa de outro amor que possa assentar-se inteiro e
confortavelmente ao lado... No mesmo sofá, para comer a mesma pipoca e assistir
ao mesmo filme. Não adianta o corpo estar prazerosamente recostado naquele
ombro que você adora, e a cabeça estar todos os dias e noites naquela bolsa,
naquele par de sapatos, naquele restaurante badalado, naquele carro importado...
Tudo que custa 100 vezes mais do que o salário de ambos e que só em sonho você
poderá comprar. Casal nenhum pode ser feliz quando um é infeliz. Se o médico
altruísta da novela faz de sua profissão, uma missão e não um comércio,
consciente de que para tanto, ganhará menos do que poderia e sente-se feliz com
isso, como poderá ser feliz ao lado de uma mulher que acha que luxo é
necessidade básica? Apesar do evidente sofrimento do marido, ela prestou um grande favor a ambos, pois ao abandoná-lo abriu caminho para que um amor parceiro chegue
para ele.
Antes de qualquer coisa, amor é olhar junto na
mesma direção. Torna-se inviável caminhar lado a lado, quando um se dedica a
aliviar a miséria humana e o outro a juntar milhões para comprar um
par de brincos.